• 3 de outubro de 2017

Prof. Dr. Mauricio Malavasi GanançaProfessor Titular de Otorrinolaringologia da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina.


Conceitos

A migrânea ou enxaqueca é uma doença do sistema nervoso central muito comum em consultórios médicos e pronto atendimentos hospitalares. Pode ser persistente e debilitante. A fisiopatologia não está completamente esclarecida, mas admite-se o envolvimento combinado vascular e neural do sistema nervoso central e periférico. É frequentemente subdiagnosticada e inadequadamente tratada por confusão com sinusite ou outras causas de cefaleia.

Vários sintomas são relatados, como cefaleia hemicraniana pulsátil, progressiva por horas ou dias, com ou sem manifestações premonitórias (aura visual, sensitiva ou motora), hipersensibilidade a luz, sons e/ou odores, enjoo (inclusive em veículos em movimento), vômito, dores abdominais, dificuldade de concentração e de memória, confusão mental, espasmos e dores cervicais, ansiedade, depressão e pânico. Estresse, exercícios físicos, privação do sono, variações das condições meteorológicas, vários alimentos e bebidas são alguns fatores precipitantes. Parentes próximos com enxaqueca podem estar nos antecedentes familiares. Pode surgir em crianças, adolescentes, adultos e idosos, sendo mais frequente no sexo feminino.

Antidepressivos tricíclicos, betabloqueadores, bloqueadores de canais de cálcio e anticonvulsivantes (topiramato, valproato de sódio) são alguns dos medicamentos usados no tratamento profilático da migrânea. Na crise, podem ser utilizados analgésicos, triptanos (sumatriptano, naritriptano) ou anti-inflamatórios (naproxeno).

A migrânea vestibular (MV) é caracterizada por vertigem e/ou outros sintomas e sinais otoneurológicos que podem surgir junto ou não com a cefaleia. O diagnóstico é baseado na história clínica. Sinais vestibulares centrais e/ou periféricos podem ser encontrados na crise vertiginosa; perda auditiva, zumbido e plenitude aural também podem ocorrer. Os sintomas são leves, quando não interferem nas atividades, moderados, se interferem e severos, se as impedem.

Aspectos otoneurológicos multiformes

A vertigem espontânea ou posicional pode ser causada pela enxaqueca ou por vestibulopatia associada, como a doença de Menière e/ou a vertigem posicional paroxística benigna (VPPB).

A doença de Menière e a VPPB ocorrem mais em pacientes com migrânea do que em não migranosos. Se o quadro clínico é típico, podem ser afecções paralelas à migrânea. Quadros atípicos são frequentes e podem sugerir MV. As semelhanças entre MV, doença de Menière e VPPB e suas combinações, fazem supor que poderiam ser variantes de uma mesma afecção, a enxaqueca.

Pacientes com MV eventualmente referem episódios vertiginosos recorrentes na infância (vertigem paroxística benigna infantil), que podem ser precursores da migrânea.

É importante considerar sempre os diagnósticos diferenciais pertinentes ao quadro clínico de cada paciente, de acordo com a faixa etária acometida.

Cuidados à avaliação otoneurológica

Audiometria, VEMP, pesquisa de vertigem/nistagmo posicional e de movimentos sacádicos, rastreio pendular, pesquisa de nistagmo optocinético, posturografia estática e dinâmica, prova rotatória e calórica podem apresentar anormalidades na fase aguda e/ou no período intercrítico em pacientes com MV.

Os migranosos têm hipersensibilidade sensorial peculiar, que pode resultar em vertigem intensa, náusea, vômito, pré-síncope, síncope, crise de enxaqueca ou aura (nos casos de migrânea sem dor de cabeça) à estimulação durante ou após vídeo teste do impulso cefálico, pesquisa de nistagmo optocinético, prova rotatória e calórica.

Para tentar evitar que a prova calórica seja insuportável, pode-se monitorar a intensidade do nistagmo e da vertigem desde o início da estimulação térmica. O nistagmo pode ser intenso, com vertigem e enjoo ainda suportáveis no início da primeira estimulação (aos 20 ou 30”, por exemplo). A estimulação pode ser interrompida e as outras devem ter a mesma duração, para analisar apenas se as respostas são simétricas ou não. Infelizmente esta situação é comum em pacientes migranosos.

Na vertigem aguda da MV, o nistagmo espontâneo e o posicional podem ser encontrados, indicando lesão do sistema nervoso central (mais frequente) ou periférica. Há casos com leve perda auditiva neurossensorial, especialmente nas frequências agudas, não progressiva. No intervalo entre as crises, os testes otoneurológicos podem apresentar anormalidades ou não.

Como tratar

Resultados favoráveis ocorrem na maioria dos casos com uma combinação de dieta, medicação e reabilitação vestibular (RV), respeitando restrições e contraindicações pertinentes.

A dieta de restrição de carboidratos de absorção rápida e de mudança de hábitos é similar à da doença de Menière: o paciente deve evitar longos períodos sem comer, fazer as três refeições principais e ingerir dois a três litros de água de modo fracionado durante o dia. Gatilhos da enxaqueca (vinho tinto, café, chocolate, queijos amarelos, alimentos embutidos, etc.) e aspartame devem ser evitados.

Como medicação profilática, venlafaxina e clonazepam são costumeiramente eficazes. Para tentar evitar ou minimizar a vertigem aguda, podem ser usados clonazepam e ondansetrona por via sublingual e/ou de flunarizina e de domperidona por via oral.

Na doença de Menière típica, a medicação com betaistina, e clonazepam, dieta, mudança do estilo de vida e RV são úteis. A VPPB típica é tratada por manobras de reposição de otólitos, repetidas nas recorrências. Automanobras são úteis nos casos resistentes. A vertigem e o nistagmo posicionais atípicos da MV também se beneficiam com as manobras e automanobras, por mecanismo de habituação.

A RV nos casos de MV inclui exercícios físicos que atuam sobre o reflexo vestíbulo-ocular, estabilidade do olhar, interação vestíbulo-ocular, controle postural estático e dinâmico e manobras de habituação. A RV deve ser gradualmente introduzida em sessões sucessivas periódicas, treinando o paciente para fazer os exercícios diariamente em casa.

A aderência do paciente ao protocolo terapêutico e a interação médico-paciente são fatores essenciais para a obtenção de resultados favoráveis.

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