Voltar O papel dos exames de imagem na avaliação da tontura


Eloisa Maria Mello Santiago Gebrim, Doutora em Radiologia e Médica Assistente do HCFMUSP

Júlia Scomparin Magalhães, Aluna de complementação especializada em Diagnóstico por Imagem em Cabeça e Pescoço e Neurorradiologia do HCFMUSP

 

“Os aspectos das coisas que são mais importantes para nós ficam ocultos devido à sua simplicidade e familiaridade. Os verdadeiros fundamentos de sua investigação não ocorrem absolutamente a um homem.” (Wittgenstein, retirado do livro – O homem que confundiu sua mulher com um chapéus, Oliver Sacks).

 

Por serem tão naturais e intrínsecos a nossa natureza, sequer notamos a existência dos sistemas que nos são tão úteis para a manutenção do nosso equilíbrio no dia a dia: a propriocepção, a visão e o sistema vestibular. No entanto, a sua ausência ou o seu funcionamento anormal podem ser muito marcantes ou até mesmo debilitantes. Existem numerosas doenças que podem levar ao desbalanço desses sistemas com consequente tontura. Porém, como os exames de imagem podem ajudar a estreitar as hipóteses diagnósticas na avaliação desses pacientes?

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Imagem coronal de RM com ponderação em T1, pós contraste, evidencia lesão no ângulo pontocerebelar direito, com extensão ao poro acústico interno, sugestiva de Schwannoma vestibular.

 

 

Uma gama de causas cardiovasculares, endócrinas, psiquiátricas ou relacionadas a drogas podem ser excluídas antes de considerar prosseguir a investigação com estudo de imagem. A distinção entre causas periféricas e centrais, além de sintomas associados, tempo de instalação e fatores agravantes são essenciais para guiar a estratégia da investigação radiológica, e portanto devem ser incluídos nos pedidos dos exames.

 

Tanto a tomografia computadorizada (TC) quanto a ressonância magnética (RM), têm papel na avaliação das estruturas da orelha interna. A TC é ideal para avaliação das estruturas ósseas, demonstrando erosões, fraturas, alteração da mineralização, bem como o posicionamento de próteses. A RM é indicada para avaliação dos espaços perilinfáticos e endolinfáticos, além dos nervos vestibulares. Imagens altamente pesadas em T2  com a técnica “steady-state free precession” gradiente-eco (por exemplo FIESTA) ou spin-eco (SPACE), são adquiridas para demonstrar o labirinto, os pares cranianos, o meato acústico interno e o ângulo pontocerebelar. Imagens adicionais volumétricas pesadas em T1 após a injeção de meio de contraste paramagnético vão ajudar a analisar etiologias neoplásicas ou inflamatórias relacionadas a estas estruturas.

 

As vias vestibulares centrais se estendem para o mesencéfalo rostral, núcleos oculomotores, cerebelo (flóculo, vermis e nódulo), tálamo e córtex (temporal, parietal e insular). Há também projeções descendentes para a medula cervical através dos tratos vestíbulo-espinais medial e lateral. Portanto, a avaliação por imagem de todo o encéfalo pode ser necessária. Apesar da TC ser muito solicitada no contexto de emergência principalmente na suspeita de infarto ou hemorragia, a RM é o exame de escolha. Imagens de difusão facilitam a visualização de isquemias agudas, enquanto realces anômalos podem evidenciar neoplasias ou quadros inflamatórios. Angio-TC e angio-RM podem ser usadas para avaliar o sistema vértebro-basilar em pacientes com isquemia de território posterior.

 

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Tabela (adaptada de: Imaging of dizziness; S.E.J. Connor, N. Sriskandan / Clinical Radiology) demonstra o resumo das recomendações de exames de imagem de acordo com as diferentes suspeitas clínicas.

 

Quando a tontura está associada perda auditiva neurossensorial assimétrica ou unilateral, estudos de imagem são indicados, principalmente para excluir tumores do ângulo pontocerebelar, cisterna ou conduto auditivo interno, sendo o mais comum o schwannoma vestibular. Outros exemplos de formações que podem ser encontradas nesta topografia são meningiomas, cistos epidermoides/dermoides e aracnoides, tumores do saco endolinfático e outros schwannomas.

 

Se os pacientes apresentam sintomas vestibulares que são provocados pelo ruído (fenômeno de Tullio), exames de imagem podem ser solicitados para excluir deiscência do canal semicircular. A TC evidencia descontinuidades nos canais semicirculares geralmente de forma mais acurada que a RM, e reformatações oblíquas no plano de Poschl e Stenver evidenciam essas alterações. Na suspeita de colesteatoma, a RM com difusão pode corroborar o diagnóstico, enquanto o estudo de TC poderá evidenciar possíveis fístulas como complicações. Já no caso de suspeitas de contato do nervo vestibulococlear com alças vasculares, as sequências de RM altamente pesadas de T2 são utilizadas.

 

Quando a tontura se desenvolve após a cirurgia de colocação de prótese de estribo, a TC fornece informações valiosas. Os sintomas podem resultar do deslocamento da prótese, de um fragmento ósseo que entra no vestíbulo, hemorragia labiríntica ou fístula perilinfática. Nos casos de suspeita de labirintite, as sequências de RM ponderadas em T1 após administração do meio de contraste podem demonstrar realce das estruturas do labirinto membranoso.

 

Etiologias centrais  frequentemente têm um correlato de imagem estrutural, tal como um isquemia, hemorragia, desmielinização, encefalite, causas metabólicas ou tumorais. A tontura e o desequilíbrio também podem ser uma manifestação degeneração cerebelar hereditária ou adquirida (por exemplo, paraneoplásico, etanol).

 

Em muitos casos as etiologias por trás das tonturas podem ser manejadas exclusivamente clinicamente. Porém, em casos específicos como quando há sintomas neurológicos associados, sintomas auditivos assimétricos, desencadeantes sonoros, doenças da orelha média, pós-cirurgias e pós-trauma, os exames de imagem podem ser de grande importância na investigação.

 

Fontes Bibliográficas:

  • Connor SEJ, Sriskandan N, Imaging of dizziness, Clinical Radiology (2013), http://dx.doi.org/10.1016/j.crad.2013.10.013
  • PATKAR, Deepak; YEVANKAR, Girish; PARIKH, Rashmi. Radiology in Vertigo and Dizziness. Otorhinolaryngology Clinics · Maio/2012
  • RIBEIRO, Bruno Niemeyer de Freitas et al. Tontura e seu desafio diagnóstico: achados na tomografia computadorizada e ressonância magnética. Radiol Bras. 2017 Set/Out;50(5):328–334

 

 

 

 

 

 

 



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